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quinta-feira, 3 de abril de 2014

'É uma vergonha para nós', diz ex-diretor da NSA sobre espionagem

Michael Hayden
Em entrevista à Spiegel, o ex-diretor da NSA Michael Hayden, 69, discutiu as revelações sobre a espionagem dos EUA sobre a Alemanha tornadas públicas pelos documentos que vazaram por meio de Edward Snowden, a vigilância de líderes alemães e as tensões entre Berlim e Washington. Michael Hayden, 69, atuou como diretor da Agência Nacional de Segurança de 1999 a 2005. Depois de deixar a NSA, ele serviu como diretor da CIA de 2006 a 2009. Hoje ele é sócio da firma de consultoria Chertoff Group em Washington, DC. A Spiegel recentemente conversou com o ex-general da Força Aérea em Washington para uma entrevista ampla sobre as revelações do arquivo do ex-contratado da NSA Edward Snowden, inclusive sobre as alegações de que a agência de inteligência espionava o telefone celular da chanceler alemã Angela Merkel, que foram motivo de tensões transatlânticas significativas.

Spiegel: General Hayden, vamos falar sobre o futuro da internet. Você está preocupado?

Hayden: Estou muito preocupado. Este pode ser o efeito mais destrutivo, nos últimos dez meses, do que Snowden revelou. A internet começou nos Estados Unidos e é baseada em tecnologia norte-americana, mas é uma atividade global. Nós, nos Estados Unidos, sentimos que ela reflete um povo livre, ideias livres e comércio livre. Há países que não querem a internet como a conhecemos. Rússia, China, Irã, Arábia Saudita. As revelações de Snowden agora permitem que eles argumentem que nós, norte-americanos, queremos uma internet única e unitária, porque isso nos ajuda a espionar. Meu medo é que as revelações possam desencadear um movimento que acabe ameaçando de fato a internet como a conhecemos.

Spiegel: Não são só os russos e chineses que usam esse argumento, mas também os norte-americanos como o fundador do Facebook Mark Zuckerberg. Ele recentemente descreveu o governo dos EUA como uma ameaça para a internet.

Hayden: Quanto mais pessoas como ele dizem isso, mais isso fortalece indiretamente esses outros argumentos. Os russos e os chineses não estão dizendo isso para se proteger contra uma suposta espionagem norte-americana. Eles estão dizendo isso porque não gostam da liberdade de discurso da internet. Seu objetivo é dividir a internet em domínios nacionais e criar barreiras no ciberespaço. Esta é a última coisa que Zuckerberg gostaria que acontecesse.

Spiegel: Por um lado, os Estados Unidos promovem a internet como uma ferramenta de liberdade. Por outro, para muitas pessoas ela agora parece uma ferramenta de vigilância.

Hayden: Estou muito disposto a discutir o que o meu país fez ou não, mas isso precisa ser baseado em fatos. Deixe-me primeiro apontar que a NSA não monitora o que todos os norte-americanos fazem na internet. A NSA não checa o que vai para qual site. Mas essas crenças estão por aí agora.

Spiegel: Seu antecessor como chefe da NSA, o general Kenneth Minihan, comparou a internet à invenção da bomba atômica. Ele disse que um novo esforço nacional deveria ser feito na direção de um único objetivo, "a superioridade da informação para os EUA" no ciberespaço. Parece que vocês chegaram muito perto.

Hayden: Nós, norte-americanos, pensamos na doutrina militar e em "domínios" - terra, mar, ar, espaço. Como parte do nosso pensamento militar, pensamos no ciberespaço como um domínio. Deixe-me definir a dominação aérea para você: a dominação aérea é a capacidade de os Estados Unidos usarem o domínio aéreo nos momentos e lugares que escolher enquanto nega seu uso aos adversários em momentos e lugares em que é nosso interesse nacional legítimo fazer isso. É natural para ele transferir isso para o domínio do ciberespaço. Não acho que seja uma ameaça à paz mundial e ao comércio mais do que a Força Aérea norte-americana é uma ameaça à paz mundial e ao comércio.

Spiegel: Mas você entende que as pessoas em outros países estão preocupadas com um país tentando ganhar a "superioridade" sobre algo transnacional como a internet?

Hayden: Certamente, e entendo totalmente isso. Agora, outros países estão criando comandos cibernéticos, mas nós fomos os primeiros a dizer isso com ênfase publicamente. Na época em que o Comando Cibernético dos EUA foi criado, a McAfee fez uma pesquisa com especialistas em segurança cibernética no mundo todo. Uma das perguntas que eles fizeram foi: "quem você mais teme no ciberespaço?" A resposta foi os chineses. Entre a pluralidade de pessoas em todo o mundo, a resposta foi os norte-americanos.

Spiegel: A agência de inteligência britânica GCHQ fala de "controle" sobre a internet, e em outro documento, funcionários da NSA dizem que querem "ser donos" da internet. Chegou o momento de uma nova abordagem?

Hayden: Talvez não de uma nova abordagem, mas certamente de um novo vocabulário. Podemos ter sido um pouco dramáticos demais em nossa linguagem.

Spiegel: Então foi apenas um problema de linguagem?

Hayden: Não. Mas as nações fazem espionagem. A minha, também. Somos muito bons nisso. Gastamos muito dinheiro nisso: mais de US$ 50 bilhões por ano para o esforço nacional. O problema é que desde que as revelações de Snowden estamos falando sobre a espionagem norte-americana, britânica e australiana, mas não sobre a espionagem chinesa ou russa. Por mais poderosos que sejam esses três que mencionei, eles na verdade se auto-limitam. Eles também são os mais transparentes. Considere que agora os parlamentares europeus sabe bem mais sobre a Agência de Segurança Nacional do que jamais saberão sobre seus próprios serviços de inteligência.

Spiegel: Não há uma incongruência entre seu país ser um defensor da internet como um símbolo de liberdade e o objetivo, como coloca a NSA, de dominar a internet?

Hayden: Eu não diria incongruência. Mas há uma dissonância. Durante o Despertar Árabe meu governo estava na verdade dando dinheiro para ONGs repassarem softwares para cidadãos de países árabes para proteger seu anonimato. Existem valores conflitantes, mas o estado tem um interesse legítimo na liberdade, e o estado tem um interesse legítimo em segurança.

Spiegel: Faz quase um ano que Snowden deixou o Havaí. O que mudou?

Hayden: Há três ou quatro efeitos. Fazemos isso, como outros países, por motivos legítimos, e é mais difícil fazer isso agora com o que se tornou público, alvos legítimos de inteligência. Ficou mais difícil para os serviços norte-americanos cooperarem com serviços amigos com objetivos em comum. Qual serviço estrangeiro gostaria de cooperar conosco, dada nossa aparente e absoluta incapacidade de manter algo em segredo? E isso prejudicou muito a indústria norte-americana, e é por isso que os Mark Zuckerbergs do mundo e os Eric Schmidts do mundo estão expressando tamanha indignação. Eles não estão fazendo nada para o governo norte-americano que outras companhias não fazem para os governos anfitriões quando recebem um pedido legal, mas foram citados separadamente, e foram injustamente prejudicados por isso. E, por fim, isso envenenou as relações entre povos que de fato são amigos.

Spiegel: A Alemanha, por exemplo.

Hayden: A questão toda sobre a chanceler tornou isso muito mais difícil. Embora eu não esteja preparado para me desculpar por espionar outra nação, estou preparado para me desculpar por constranger uma boa amiga. Estou preparado para me desculpar pelo fato de não termos conseguido guardar o que quer que tenha sido que possamos ter feito ou não em segredo e, portanto, por ter colocado uma amiga numa posição muito difícil. É uma vergonha para nós. E a culpa é nossa.

Spiegel: Nós não ouvimos um pedido de desculpas oficial.

Hayden: Estou preparado para pedir desculpas.

Spiegel: Há algum bom motivo para grampear o telefone celular de Merkel?

Hayden: É difícil de responder uma vez que não estou no governo. Mas as intenções da liderança sempre são alta prioridde, um objetivo da inteligência estrangeira. Em 1978, o presidente Carter, dos EUA, apontando o dedo para seu pessoal de inteligência nos Acordos de Camp David entre os egípcios e israelenses, dizendo: "quero saber o que Anwar al-Sadat e Menachem Begin pensam. Quero saber o que eles pensam sobre mim. Quero saber o que eles pensam um sobre o outro. Quero saber o que eles sentem em seus corações sobre o acordo que colocamos na mesa." Como você pode fazer isso? Suspeito que terá que fazer uma vigilância agressiva de suas comunicações. Se a circunstância se aplica à chanceler é uma questão totalmente diferente, mas eu acrescentaria que o antecessor da chanceler... …

Spiegel: … Gerhard Schröder…

Hayden: … fez toda uma série de coisas que eram um tanto inconsistentes com a visão norte-americana do mundo, o que não significa dizer que a visão norte-americana está certa. Nós fizemos a guerra do Iraque com pontos de vista muito diferentes. Sua abordagem em relação à Rússia era muito diferente da abordagem dos norte-americanos, e, por fim, todo essa questão das garantias de empréstimo de um bilhão de euros da Gazprom também levanta dúvidas, que podem ser respondidas por esse tipo de atividade.

Spiegel: Isso justificaria a escuta do telefone celular dele?

Hayden: Não vou tirar esta conclusão. O que vou dizer, entretanto, é que você pode ter circunstâncias como estas em que é mais atraente fazer do que não. Em 2008, quando o presidente Obama foi eleito, ele tinha um BlackBerry. Nós pensamos, pelo amor de Deus, livre-se disso. Ele disse, "não, vou ficar com ele". Então fizemos algumas coisas para torná-lo um pouco mais seguro. Estávamos dizendo ao cara que logo seria o homem mais poderoso do país mais poderoso da terra que se ele usasse seu telefone celular, seu Blackberry, na capital nacional, inúmeros serviços de inteligência estrangeiros ouviriam seus telefonemas e leriam seus e-mails. É simplesmente assim que funciona.

Spiegel: Os alemães são mais sensíveis no que diz respeito à questão da vigilância.

Hayden: Confesso que nós, norte-americanos, não compreendemos o suficiente o impacto disso não só sobre a chanceler como também sobre o povo alemão, e digo isso com sinceridade. Talvez tenhamos subestimado a profundida dos sentimentos que o povo alemão - e, novamente, não só a chanceler, mas o povo alemão, sente-se em relação à esta questão da privacidade, dadas suas circunstâncias históricas comparadas às nossas circunstâncias históricas. Na Conferência de Segurança de Munique ficou clara para mim que os alemães podem enxergar a privacidade da forma como nós norte-americanos podemos ver a liberdade de expressão ou de religião. Talvez nós não tenhamos compreendido.

Spiegel: Você acha que o presidente perdeu a chance de informar à chanceler sobre os fatos quando a visitou em Berlim em junho passado?

Hayden: Eu não conheço os fatos do caso, mas para ser totalmente honesto com você e seus leitores, o presidente prometeu não vigiar Angela Merkel. Esta não foi uma promessa de que nenhum chefe de governo alemão jamais será vigiado.

Spiegel: Quem toma a decisão de monitorar o telefone celular de Schroeder ou de Merkel? A Casa Branca sabia disso?

Hayden: Nosso governo deixou claro que o presidente não sabia e eu direi simplesmente que se o presidente disse que não sabia, então o presidente não sabia, ponto final. Mas não é plausível que a Casa Branca não soubesse. Não é plausível que o Conselho Nacional de Segurança não soubesse. Mas isso não foi uma decisão pessoal por parte do presidente.

Ex-diretor da NSA: 'É uma vergonha para nós'

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